Era
uma noite enluarada, quase se escondendo, pois o sol, estava chegando. Estrelas
mil cintilavam pelo azul anil; a madrugada quente, fervilhava meu coração. Sei
lá, estava muito alegre. Levantei-me apressado.Rosto lavado,roupa trocada,
barba feita. Vestí a minha melhor “farpela”.Meus sapatos
engraxados,brilhavam.Tanque cheio, lá vou eu para a passeata no velho e bem
conservado “carango”,uns dez anos de uso, só na minha mão...Fogos espocavam por
toda a cidade. Dos rincões do “São Benedito”, ouviam-se os rojões que vinham do
“Abadião”.Entrei no querido “carango”, ouvindo o barulho dos fogos nas bandas
das “Mercês”,que ecoava no “Fabricio”, passando pelo “Boa vista” e terminando
nos “Estados Unidos...
A
terrinha estava em festas! Festa,não! Festão !A “ sagrada”, tinha acabado de
ganhar uma espetacular e sonhada “planta de amônia”! Minha santa ignorância
quis saber do que se tratava essa grande conquista que arrebatara de tanta
alegria, a nossa cidade. Amônia?Planta?Na mesma hora um competente secretário
municipal, foi me ensinando:-Planta é a fábrica ! Dois mil
empregos,diretos!Amônia é o produto que está em falta no Brasil e absoluto
componente para compor os nossos nitrogenados (?).Será produzido em Uberaba,
entendeu, seu burro !”Fiz sinal com a cabeça que havia entendido.-“Ah! muito
bom”...
A
carreata, com dezenas de carros,percorria ruas e avenidas da santa terrinha.Um
barulhento “trio elétrico” tocava o hino da cidade,depois o hino do Uberaba
Sport,seguido do hino do Nacional,vindo depois o hino do Independente, do
Conservatório,o samba”Uberaba-bão” tema de campanha do Chico Veludo.Um locutor
de voz forte e eufórico ( se não me engano era a do Eustáquio Rocha...),
bradava com toda a força dos pulmões ,que chegara a redenção de Uberaba !O
Brasil estava à salvo com a “planta de amônia”!O governo municipal,auxiliado
pelos nossos deputados, estaduais e federais, venceram, depois de luta
indômita, a batalha consagradora! A “ planta de amônia” era de Uberaba e
ninguém tasca !
O
gás necessário para implantação da indústria,estava resolvido ! O governo de
Minas, tão “amigo” e puxa-saco da nossa região, já tinha dado a “ ordem de
serviço” para o gasoduto de Queluzito (região de Betim) “abastecer” a “planta
de amônia de Uberaba”..empreendimento que iria multiplicar outra indústrias
instaladas e por se instalar no trecho...De dez a quinze cidades, cresceriam
com a passagem do “duto” pelas suas cidades. Euforia !Beleza !
O
“trio elétrico” da Prefeitura ,tocava música do”gás total”. A Escola de Samba
do Cabuçu (“c” cedilha,viu...)estava com o “enredo” pronto para o próximo
carnaval:-“Uberaba na era do gás total”!Alguns carros
alegóricos,desenhados:Chico Xavier,montado num boi zebu; Mário Palmério,ao
piano,dedilhando em marcha-rancho, a sua “Saudade”, Antenógenes Silva, na
sanfona,tocando em ritmo de samba-batucada,”Saudade de Uberaba”,Fidélis
Reis,altivo,à porta de uma maquete do SENAI, Joubert de Carvalho,faceiro,a
vontade..”De papo pró á...”
A
“Marquez do Sapucaí,apinhada e uberabenses, delirava ! “Que cidade maravilhosa,
quanta coisa linda meu Deus !Essa fábrica (planta)será a redenção do Brasil, em
insumos e fertilizantes”, cantava a massa ignara, dependurada nas arquibancadas
da Sapucai”. O locutor do desfile (não era mais o Eustáquio
Rocha...)anunciava:-“Uberaba cumpre o que promete !”
Acordei
! Olhos remelentos e nariz escorrendo.A bruma seca,chegou !
Luiz Gonzaga de Oliveira