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sexta-feira, 5 de julho de 2019

O MEIO AMBIENTE E OS IMÓVEIS

DE VALOR ARQUITETÔNICO 

“Pimenta nos Olhos dos Outros é Refresco”

Uma das aventuras intelectuais de nosso tempo consiste em perceber, aqui, ali e em todo lugar, manifestações do pensamento unilateral, que vislumbra as questões e os problemas humanos, sociais e administrativos por apenas um prisma e que se origina de pessoas alheias aos contextos reais em que essas questões e esses problemas surgem ou ocorrem; de pessoas sem comprometimento e, principalmente, sem responsabilidade direta com as causas, as manifestações e as resultantes que compõem as situações criticadas. Pessoas, enfim, dedicadas a outros misteres, destituídas do contato, da vivência e da experiência com as circunstâncias, e, por isso, indiferentes às consequências advindas àqueles diretamente nelas e por elas envolvidos.

Ao contrário do conceito de Ortega y Gasset, de que o ser humano é ele e sua circunstância, esses críticos são eles e sua idealização preconceituosa do real.

É o que acontece, por exemplo, com os que têm a pretensão de defender o meio ambiente sentados em seus gabinetes, escritórios, bibliotecas, cátedras e redações, desvinculados da realidade, emitindo opiniões e propostas idealizadas.

No caso das matas, das encostas e das margens dos cursos d’água, bem como dos imóveis de valor histórico e arquitetônico, defendem simplesmente sua preservação a todo custo, seja em prol da sobrevivência da humanidade, seja para conservação da memória e do valor artístico.

Contudo, como não possuem propriedade rural nem imóvel de valor histórico-arquitetônico, julgam que só os proprietários desses bens é que deverão ser obrigados a preservá-los e mantê-los intactos para gáudio e usufruto de toda a sociedade, sob pena de criminalização e penalização.
“Pimenta nos olhos dos outros é refresco”, diz o ditado.

Não lhes ocorre, a esses unilaterais, que se é para o bem de todos, entre todos deverão ser distribuídos os ônus da manutenção desses bens.

São, pois, injustos, quando não francamente inconstitucionais, inúmeros dispositivos da legislação ambiental e de preservação dos monumentos arquitetônicos ao transferir e impor aos proprietários desses bens o encargo de sua conservação, prescrevendo-lhes até multas e penalidades.

Diante dos exageros e absurdos a que esse unilateralismo está chegando, é hora de se questioná-lo para alterar essa legislação iníqua, e também unilateral, distribuindo (e atribuindo) a todo o corpo social os custos daquilo que o beneficia e que a esses proprietários prejudica.

No caso das áreas de “Reserva Legal” - não prevista, segundo consta, em legislação de nenhum outro país - sua existência e obrigatoriedade devem ser abolidas ou, então, seus proprietários indenizados em espécie pelo justo valor de mercado e a propriedade dessas áreas, sua reflorestação, conservação e vigilância serem transferidas e delegadas única e inteiramente aos órgãos públicos, que existem para isso, como o nome indica, ou seja, para cuidarem das coisas e bens “públicos”.

Não é justo nem legítimo (e, por isso, não deve ser legalizado) que o proprietário rural, além de não poder cultivar boa parte de sua área (em alguns casos até mais de 40%), ainda seja responsabilizado (e penalizado) por sua conservação, sendo até considerado criminoso ambiental se não o fizer.

No que se refere aos imóveis urbanos (e até alguns rurais) considerados de valor artístico, arquitetônico, histórico e cultural - em separado ou tudo junto - devem seu uso, gozo e propriedade serem totalmente liberados no país e nem serem os órgãos públicos obrigados a adquiri-los e conservá-los. Por várias razões.


     Fotos: Paisagem e igrejas de Uberaba - Parque das Paineiras - Igrejas Santa Rita e São Domingos.

Primeiro, o clima é tropical, quente, úmido em boa parte, repleto de parasitas como o cupim, não permitindo, pois, a eternização desses imóveis. Não há possibilidade de que imóveis construídos nos trópicos - quanto mais tempo, maior precariedade do material empregado - subsistam eternamente. Não tem sentido, pois, submeter gerações de proprietários ao sacrifício (penoso e às vezes inaudito) de mantê-los, porque um dia perecerão e tudo terá sido inútil, em vão.

Segundo, porque tais imóveis, submetidos aos rigores de clima impróprio à conservação, exigirão quantias cada vez mais vultosas para sua conservação. Para restauração, então nem se fale.
Terceiro, porque, toda importância aplicada no decorrer dos anos, décadas e séculos para isso, será desviada da manutenção da família dos proprietários. No caso de sua aquisição por órgão público, as quantias necessárias no decorrer dos tempos para sua conservação e restauração não só seriam vultosas como desviadas da educação, saúde, saneamento básico e segurança da população, apenas para que algum passante não distraído, algum visitante esporádico ou raríssimo interessado apreciem as peculiaridades desses imóveis.

Quarto, é necessário mais algum argumento? Só a circunstância da extrema onerosidade para conservação, manutenção e restauração periódicas desses imóveis no decorrer dos tempos para se chegar lá adiante e vê-los desaparecer não basta?

À evidência que raríssimos imóveis podem e devem ser objeto de todo esse cuidado e ônus. Contudo, raríssimos, como em Uberaba, por exemplo, apenas as igrejas de Santa Rita, São Domingos, a capela do colégio Nossa Senhora das Dores, o prédio da Câmara Municipal e mais um ou dois outros.
Os demais, que sejam filmados e fotografados e se deixe a vida correr.

Enfim, não é justo (nem racional) que o proprietário de imóvel de valor histórico-arquitetônico ou localizado em entornos culturais, além de ter depreciado seu valor e perder a possibilidade de sua normal comercialização, ainda seja constrangido a dele cuidar e manter e nem que órgãos públicos o façam em detrimento e em prejuízo do atendimento de necessidades básicas da população em geral.
De mais a mais, tanto o decreto-lei federal n° 25, de novembro de 1937 quanto outras leis e todas as pessoas que se extremam em propugnar e defender a preservação do patrimônio arquitetônico não manifestam igual (e geralmente nem o mínimo) interesse e cuidado com a preservação do patrimônio artístico-cultural representado pela música, pintura, fotografia, escultura, livro, filme, etc., dos quais milhares de exemplares já se perderam completamente e a cada dia mais e mais de seus espécimes vêm sendo sistematicamente destruídos. E a preservação desse patrimônio não prejudica seus autores e descendentes. Ao contrário.


(Guido Bilharinho)
 
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Cidade de Uberaba