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quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

CANTOR DE VIDAS – RAUL AUGUSTO NO “BAR DOS APOSENTADOS”

Raul Augusto


Conheci Raul Augusto no “Bar dos Aposentados”, numa das ruas mais tradicionais do centro de Uberaba. Simpático, ele cumprimentava a todos e a mim, também. Sempre ficava sentado à mesa com nosso amigo comum, o advogado e corretor de imóveis aposentado Ronaldo José da Silva.

Com o passar dos tempos, contava a nós que era português e viera ao Brasil cantar fados, apaixonando-se pelo país e a esposa, depois de anos e anos viajando mundo afora a cantar em cruzeiros marítimos. Mas a terra natal, um vilarejo no Norte de Portugal sempre estava nas suas memórias a descrever-nos. Fazia e contava piada dos natalícios como ele só. Confidenciou que a primeira música que interpretou foi de um brasileiro.

Nas últimas rodas de proza, sempre cantarolava músicas que interpretou nas emissoras de rádio e TV, de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Contou no nosso último encontro que dias antes cantava num tom maio alto no banheiro a música “Só Nós Dois” e quando se enxugava uma vizinha bateu na porta de seu apartamento. Queria que lhe emprestasse o disco que estava ouvindo. Para a surpresa da mulher, respondeu que estava apenas a cantarolar.

Também nos mostrou o cartaz do espetáculo que fazia cotidianamente em Belo Horizonte no Hotel Del Rey, como se quisesse nos deixar uma lembrança. Cantou baixinho algumas músicas, para não chamar a atenção dos clientes do bar.

Apaixonado por carros, Raul disse que não entendia porque as montadoras não fabricavam veículos conversíveis no Brasil, uma de suas paixões. E que mais tarde iria ao apartamento de sua família buscar um par de sapatos que tinha comprado e que brincara com ela que teria que ir logo para que o genro não os usasse.

Saudoso, sempre nos falava de seu convívio de mais de 50 anos de música com os cantores e os apresentadores de TV e rádio da época. Dizia que vivera uma vida feliz na profissão e na vida familiar. A morte da esposa é que lhe trouxe a Uberaba, onde viveu os oito últimos anos, próximo de uma das filhas e de um dos netos, de forma simples e pacata. Mas, quando morresse queria ser enterrado ao lado dela, o que foi feito pela família.

Em passeios que fizemos juntos, eu e Ronaldo podemos conhecer um pouco mais da intimidade de Raul Augusto. Fomos a Veríssimo, cidade de poucos habitantes e a terra dos dinossauros, Peirópolis, que o fez lembrar de sua terra natal.

Aos 83 anos, Raul ainda fazia planos. Combinamos de ir a um restaurante às margens do rio Grande, no próximo fim de semana, para saborear um peixe daquelas águas. Também projetávamos viagens a Belo Horizonte, onde queria rever a outra filha, talvez no feriado de 15 de agosto. E só adiamos um pacote para Buenos Aires por causa da estação de Inverno. Ele brincava que velho não podia pegar pneumonia e nem ter caganeira. Ainda dizia que queria nos levar a sua terra natal, para que pudéssemos ver sua beleza.

Assim, vai-se um amigo, que como a maioria dos pássaros, morre a dormir. Mas fica a memória de uma amizade simples, verdadeira e sincera.


Jornalista Alexandre Pereira