O DIA EM QUE UBERABA HUMILHOU O HERDEIRO DO TRONO |
No início de 1927 a política brasileira vivia momentos tensos. Três anos antes, as chamadas “revoltas tenentistas” da jovem oficialidade do exército haviam abalado os alicerces da decadente república do café-com-leite. A coluna dos tenentes de Prestes ainda circulava pelos sertões do País, implacavelmente perseguida pelas forças policiais. O ex-presidente da república Artur Bernardes havia concluído seu mandato (1922-1926), governando o Brasil com mão de ferro, sob quatro anos de estado de sítio.
Recém empossado, o novo presidente da República era Washington Luis, ex-governador paulista. Mas a população e os jornais de São Paulo seguiam manifestando sua antipatia pelos “bernardistas” – considerados responsáveis, entre outras coisas, pelo selvagem bombardeio da capital paulista durante a repressão do levante de 1924. Mas em Minas Gerais, e especialmente em Uberaba, o “bernardismo” seguia firme e forte.
Foi nesse contexto que passou pelo Triângulo Mineiro uma misteriosa “excursão de estudos” vinda dos cafundós de Mato Grosso e Goias, capitaneada por D. Pedro de Orleans e Bragança, filho da princesa Isabel e um dos herdeiros presumidos da Coroa Imperial brasileira. Ao chegar em Uberaba, no dia 18 de fevereiro, hospedaram-se o príncipe e sua nobre comitiva no palácio episcopal, a convite do bispo Dom Lustosa.
Não tardaram a surgir entre as lideranças políticas locais fofocas e especulações sobre os verdadeiros motivos da expedição do pretenso monarca aos sertões: o príncipe estaria, na realidade, a serviço da subversiva coluna Prestes que, na época, circulava por Mato Grosso. Submissa aos chefes políticos, a polícia foi colocada em prontidão.
Bastou que dois membros da comitiva saíssem do palácio a fim de ir ao Correio e comprar combustível, para que tomassem um legítimo “teje preso” do Delegado regional. Levados à cadeia local passaram ambos, segundo o jornal paulista Folha da Manhã, “pelas maiores humilhações, sendo despidos e revistados”.
Em seguida, um destacamento de praças comandado pelo tenente Nilo dirigiu-se ao palácio episcopal para interrogar o principe sobre os motivos da sua viagem, no que foram impedidos “pela atitude enérgica do padre Eduardo que exprobou os policiais à entrada do palácio”, no dizer do jornal.
O imbróglio só foi resolvido graças a uma dura intervenção do bispo, que usou de suas prerrogativas para conseguir a libertação de seus hóspedes. “Contrariadíssimos com a humilhação que sofreram” o principe e seus acompanhantes deixaram apresssadamente Uberaba, cruzaram o Rio Grande e seguiram viagem rumo à cidade paulista de Franca.
(ANDRÉ BORGES LOPES)