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quarta-feira, 9 de outubro de 2019

O PIANO ERUDITO DE DINORAH

Corria o mês de julho de 1934 e Uberaba estava em festa. Inaugurada no mês anterior, a Exposição Feira Agropecuária espalhava-se pelo amplo terreno da Santa Casa oferecendo atrações inéditas à população: cassino, shows musicais, circo, restaurante e parque de diversões. Nunca antes a pacata cidade havia visto um evento dessa dimensão. Aberta ao público por mais de 30 dias, o enorme sucesso da Feira animou os pecuaristas uberabenses a fundar a Sociedade Rural do Triângulo Mineiro (antecessora da ABCZ) que desde então passou a realizar as exposições anuais de gado zebu. Mas a agitação não se limitava ao recinto da Feira. Na noite de 11 de julho, a Prefeitura aproveitou a ocasião para receber com pompa uma consagrada artista uberabense, no auge de sua carreira. No salão nobre do Paço Municipal da praça Rui Barbosa, apresentou-se a pianista e compositora Dinorah de Carvalho.

Dinorah de Carvalho em 1919 – revista "Vida Moderna" (SP).

Segundo sua certidão de nascimento, Dinorah Gontijo de Carvalho nasceu em Uberaba, no dia 1º de junho de 1895 em uma família grande e abastada: era filha do comerciante (e músico amador) Vicente Gontijo e de Dona Julia de Carvalho Gontijo. Residiam em um sobrado no início da antiga Rua do Comércio (atual Artur Machado) onde, décadas mais tarde, funcionou por certo tempo a agência local dos Correios. Com a morte de Vicente, em 1904, a mãe mudou-se com os filhos mais jovens para a capital paulista. No ano seguinte, aos 10 anos de idade, Dinorah foi matriculada no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde teve aulas com o professor Carlino Crescenzo e fez amizade com os colegas Mário de Andrade e Francisco Mignone. Data de 1912 sua primeira composição: uma valsa intitulada "Serenata ao Luar". Diplomada com nota máxima em 1916, seu enorme talento como pianista não tardou a ser notado. Um ano depois, fez sua primeira apresentação profissional em Uberaba.

Programa da apresentação de Dinorah em Uberaba no jornal Lavoura e Comércio, 11/07/1934.

No final de 1920, o Congresso Legislativo de Minas Gerais lhe concedeu uma bolsa de 20 contos de reis para um aperfeiçoamento na Europa. No ano seguinte, Dinorah já vivia em Paris, tendo aulas com o pianista e compositor húngaro Isidor Philipp. A temporada na França impediu que participasse da Semana de Arte Moderna, organizada por seus amigos paulistanos. Em troca, sua música ganhou os ares do Velho Mundo: em dezembro de 1922, Dinorah e a também pianista e cantora Sigrid Nepomuceno (filha do compositor cearense Aberto Nepomuceno) interpretaram Villa-Lobos e outros autores brasileiros em um concerto que foi transmitido ao vivo pelo recém inaugurado “serviço de rádio telefonia” da Torre Eiffel.

Primeiras linhas da música "A Ti Flor do Céu" em partitura manuscrita por Dinorá de Carvalho.

De volta ao Brasil em 1924, Dinorah foi apresentada por Mário de Andrade ao maestro italiano Lamberto Baldi e incentivada a se dedicar à composição erudita – um território quase exclusivamente masculino na época. Nas décadas seguintes, Dinorah escreveu mais de 100 obras para instrumentos solistas, corais, coral e orquestra, conjuntos de câmara, piano e orquestra, orquestra sinfônica, além de música para teatro e canções. Fez arranjos para canções de tradição africana, musicou peças folclóricas e textos de poetas como Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, Carlos Drummond de Andrade e Cecília Meireles. Seu pioneirismo abriu as portas para que outras mulheres se dedicassem ao ofício de compor.

Ao mesmo tempo, consagrou-se também como intérprete, regente e professora. Nos anos 1930, organizou audições de piano na Radio Educadora Paulista e criou a Orquestra Feminina São Paulo, sendo a primeira mulher a dirigir uma orquestra no Brasil. Em dezembro de 1936, compôs as músicas e regeu, no Teatro Municipal paulistano, a produção "Noite de São Paulo" – uma fantasia em três atos com versos de Guilherme de Almeida e textos de Alfredo Mesquita e Mário de Andrade. Em 1939, foi nomeada inspetora de ensino superior no Conservatório Dramático e Musical, onde trabalhou até a aposentadoria. Na década de 1940, tornou-se a primeira mulher a integrar a Academia Brasileira de Música. Criadora de um método inovador de ensino musical, montou em casa uma escola particular que formou dezenas de pianistas. Em 1954, recebeu a medalha de ouro do IV Centenário da Fundação de São Paulo por seu trabalho de formação musical das crianças paulistas.

Dinorah casou-se em 1938 com o paranaense José Bittencourt Muricy, que era seu admirador e oito anos mais jovem – uma tremenda ousadia para a época. Viveram juntos por 40 anos, até a morte de Muricy em 1978. Não tiveram filhos, mas a tradição musical da família teve continuidade por meio de um sobrinho (filho de uma irmã mais velha de Dinorah): o também uberabense Joubert de Carvalho.

Em 1960, Dinorah voltou à Europa, dessa vez como convidada do Ministério da Educação e Cultura para uma Missão Cultural, onde apresentou suas obras e as de outros compositores brasileiros. Em 1969, compôs "Salmo XXII do Rei David, o bom pastor", peça para barítono e seis instrumentos, baseada nos versos bíblicos traduzidos por Goffredo Telles. Atuou ainda como crítica musical em periódicos paulistas – dentre os quais a revista Vanitas e os jornais A Noite e Diário de São Paulo – e foi integrante da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Faleceu em 1980, muito lúcida e ativa aos 84 anos de idade, vitimada por um enfarte.

Após décadas de relativo esquecimento, nos últimos anos suas composições têm sido recuperadas por pesquisadores acadêmicos. Não encontrei registro de que ela tenha se apresentado novamente em Uberaba. Mas o programa daquela noite de julho de 1934 reserva uma curiosidade. Dividido em três partes, na primeira e na última Dinorah interpretou peças clássicas de Brahms, Beethoven, Chopin e outros. Na segunda, mostrou composições próprias e, dentre essas, fez a primeira apresentação de um curioso “Estudo só para a mão esquerda”, (composta, talvez, como homenagem à sua colega Sigrid Nepomuceno). Infelizmente, a partitura manuscrita dessa peça pouco usual perdeu-se no tempo.

Quem tiver interesse em conhecer o repertório da virtuose e compositora erudita uberabense pode encontrar algumas de suas músicas no YouTube (buscando pela grafia atualizada do nome: Dinorá de Carvalho) ou então na página https://www.dinoradecarvalho.com, organizada pelo músico e pesquisador Flávio Carvalho.

(André Borges Lopes – uma primeira versão desse artigo foi publicada originalmente na coluna Binóculo Reverso do Jornal de Uberaba em 29/09/2019)


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Instagram: instagram.com/uberaba_em_fotos

Cidade de Uberaba

terça-feira, 2 de julho de 2019

JUSTO DOMINGUES MACIEL – BARÃO DE MACIEL

Filho do Alferes Manoel Domingues Maciel e de Maria Guilhermina de São Joaquim, estes casados em 30 de novembro de 1833. Nasceu em 1837, em Baependi, sul de Minas Gerais. Com o falecimento de seu pai em 1844, ficou sob a tutela do Capitão João Alves Maciel, casado com Isabel Francisca Maciel, sua prima. Fato curioso é o de ter sido filho único, quando a tradição da família era ter não menos que dez filhos. Ele, mesmo, teve nada menos que dezoito, dos quais seis com mortes precoces.

Justo Domingues Maciel - Barão de Maciel. 


Justo casou-se em 16 de junho de 1855 com Luiza Leocádia Ribeiro da Cunha, natural de Serranos, cujos pais possuíam a Fazenda Ribeirão, na Freguesia de Conceição do Rio Verde. 

Participou da recepção à Princesa Isabel quando de sua visita a Caxambu e Baependi em 1868; da inauguração da Estrada de Ferro São Paulo a Minas em 1884, que ia de Cruzeiro/SP à Três Corações/MG e quando da segunda visita do Conde D’Eu à Vila de Caxambu no mesmo ano. Fazendeiro e Empresário, participou da fundação da Companhia das Águas Minerais de Caxambu e Contendas, da qual foi o primeiro presidente. Integrou a Comissão responsável pela construção da Igreja de Santa Isabel da Hungria, mandada erigir pela Princesa Isabel em 1868, naquela localidade. 

Graduado no posto de Coronel da Guarda Nacional, foi comandante da corporação no município de Baependi. Em 1889, foi agraciado com o título de Barão de Maciel por Dom Pedro II. Vereador à Câmara de Vereadores daquela cidade, exerceu a presidência e integrou nessa condição o primeiro Conselho Distrital eleito após a proclamação da República em 1889. Pertencia ao Partido Liberal.

Era proprietário da Fazenda da Roseta, em Baependi, cujos limites adentravam os municípios de Caxambu e Conceição do Rio Verde. Com a abolição da escravatura trouxe imigrantes italianos, constituindo uma colônia na Fazenda, onde se produziam laticínios muito apreciados no Rio de Janeiro, além de açúcar, cachaça e muitos outros produtos. Promovia festas em batizados, casamentos e formaturas de seus filhos, sempre com bailes animados por Bandas de Música, recepcionando, políticos da Província, convidados da sociedade local e da Corte.

Hospedou o senador Theóphilo Ottoni, do Partido Liberal, para tratamento de saúde com uso de águas minerais, o qual quando chegou à Fazenda teve que ser transportado da liteira por braços humanos, tendo obtido sólida melhora quando partiu para Ouro Preto. Transformada em “Fazenda Parque da Roseta”, administrada por descendentes do Barão, o local, após restauração, possui, além de museu e centro gastronômico, espaços para atividades culturais, de artes, lazer e ecológicas, como cavalgadas, passeios por trilhas na Serra da Roseta, classificada pela UNESCO, em 1993, como “Reserva da Biosfera da Mata Atlântica”.

Faleceu o Barão de Maciel em 1900, aos 63 anos de idade, sepultado no cemitério de Caxambu. Uma de suas filhas, Adelaide, casou-se com o Dr. Alfredo Pinto Vieira de Mello, advogado pernambucano que foi Promotor Público em Baependi em 1886, Juiz de Direito em Ouro Fino, 1890, Deputado Federal em 1897, advogado no Rio de Janeiro em 1903 e Ministro do Supremo Tribunal Federal de 1921 a 1923, Honorina, casou-se com filho de Teófilo Ottoni e Theóphilo, médico, casou-se com Maria Esther Leme, filha de Luiz Gonzaga da Silva Leme, historiador paulista, autor da consagrada obra “Genealogia Paulistana”, editada em 1903.

Justo Maciel Neto, filho de Justo Ribeiro Maciel, durante a Segunda Guerra, em 1943, atuou na Inglaterra como Cadet-Air-Gunner da R.A.F ( Força Aérea Britânica). A Filha Conceição casou-se com o engenheiro e arquiteto alemão Wilhem Brozenius, responsável pela construção da igreja matriz de Aiuruoca, Paço Municipal de Uberaba e várias pontes e estradas, além de ter sido um dos primeiros gerentes do Parque das Águas de Caxambu.

(trecho do Livro "A Família Maciel de Baependi")



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Cidade de Uberaba


quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

PRAÇA RUI BARBOSA - UBERABA

Praça Rui Barbosa - Década: 1960

Foto: Autoria desconhecida
“É o mais antigo logradouro público de Uberaba, pois, foi na sua parte inferior que se começou a edificação do primeiro prédio que Uberaba teve. Dele partem as seguintes ruas, a saber, canto inferior direito, a Coronel Manuel Borges; centro, a Artur Machado. Esquerda, a Vigário Silva, lado sul, ao meio, a rua de Santo Antônio. Canto superior direito, a rua Olegário Maciel e superior esquerdo, a rua Tristão de Castro; lado norte, no meio, a rua São Sebastião. É inteiramente calçada a paralelepípedos e com luxuoso jardim à frente da Catedral do Bispado. Nos alinhamentos em diferentes lugares ficam o Paço Municipal, hoje Prefeitura, o Teatro São Luís e custosos prédios particulares. Primitivamente chamava-se ‘Largo’, mais tarde ‘Largo da Matriz Nova’, ‘Largo da Matriz’, praça ‘Afonso Pena’ (1894-1916) e finalmente praça Rui Barbosa.” (PONTES, 1970, p.287).