A história que contei ontem do Serafim
Thomé e sua mulher Marcela,não acabou.Fiel empregado do Natal Borges na “Casa
de Tábua”, Serafim ficou, anos a fio, “entalado” com a história do “Moconhó”.
Vivia a escutar um timbre de voz que pudesse lembrar-lhe quem o havia xingado
naquela terrível noite que caiu no “valo”. Nada, porém, a detalhar qualquer
sintoma que pudesse levá-lo ao maldito gozador. Trabalhava amargurado por não
poder “pegar aquele infeliz” que, na calada da noite, sabendo que não era lua
cheia e que tinha a”vista fraca”, chamou-lhe pelo apelido que odiava:
“Moconhó”...
O
tempo passa rápido. Cumprindo o mesmo trajeto da fazenda do Natal Borges a do
Otaviano Borges, estava o nosso “Moconhó” digo, Serafim Thomé, a carrear o
carro de boi da fazenda, com dois pares de canga, varais nos trinques, fueiros
bem azeitados e o “Zonzo”, “Malhado”, “Ruão” e “Fazendeiro”, os bois amestrados
do carro, tranquilos e bem preparados para a viagem. Um inicio de tarde
apreciada, , inicio do mês de outubro, calor forte e o sol, como de ocasião,
prá lá de quente. A viagem era rotina entre as fazendas. Aquela seria mais uma.
De vez em quando, uma “pancada” de chuva que dava mal e mal para molhar a
terra. Logo, logo, o poeirão subia novamente. No carro de boi, Serafim Thomé
ajeitou as sacas d e arroz, as latas de banha de porco, as latas menores de
manteiga de leite que a Marcela, com muito carinho preparara, as oiteiras de
feijão roxinho e o açúcar “moreno”, fabricado no engenho da fazenda. Tudo ajeitado
no leito do carro de boi, como pretendia dormir na fazenda do Otaviano, Serafim
para que Marcela não ficasse sozinha, tratou logo de pedir à mulher que tomasse
o seu banho de final de semana , pois ela iria acompanhá-lo.
À
noite”, pensou ele, “jogo um truquinho com o Louro, Zé Bento e o Mané Capeta”
(empregados do Otaviano) e, amanhã cedo, quando o sol começar a raiar, volto
prá casa”.Dito e feito. Banho tomado, vestido limpo trocado, cabelo penteado e
aquele “cheiro” no pescoço... Só que Marcela cismou de levar o Aleixo...macaco
de estimação da Marcela e também do Serafim. – “Ah! ele não ocupa lugar e não
vai atrapalhar ninguém”, concordou o Serafim. Assim foi feito. Iniciada a
viagem de poucas léguas, os bois tranquilos, ele sentado à frente da canga,
Marcela atrás com “Aleixo” no ombro a fazer-lhe carinhos. Não se sabe por que
“cargas d’água”, o “Aleixo” pula nas costas do Serafim e dalí para a carcaça
dos bois! Pula num, pula no outro, o “Malhado” , assustado, “ muda a marcha” do
andar, espantado a todo vapor, sai em disparada, levando com ele os demais bois
da canga. Sem poder deter os animais, o carro de boi balança prá lá e prá cá,
de um lado para o outro, quase caindo. As sacas de arroz misturavam-se com a
banha de porco, o querosene misturado com a manteiga de leite, o feijão todo
esparramado caindo pelas beiradas do carro, misturado com o açúcar
“moreno”...Serafim tenta controlar o desastre...em vão...Olhou para ver a
Marcela, está ela a debandar com o macaco “Aleixo” e, por um triz, não caiu do
carro de boi...- “Pula Marcela, pula! Senão ocê morre cedo”, gritava,
desesperado, o Serafim ...
Foi
aquele pandemônio.Com os fueiros quebrados,bois cada um por seu lado, roda
rachada, Serafim, Marcela e o “Aleixo”, só chegaram, noite entrada na fazenda
do Otaviano Borges.
No
outro dia, aquele trabalhão prá consertar os estragos do carro de boi. Suando
por todos os poros, nem percebeu que o “Aleixo” teimava em encarapitar no seu
ombro. Movido por um instinto momentâneo de raiva , Serafim pegou o “Aleixo”
pelo rabo, rodopiou, rodopiou uma meia dúzia e vezes e,”zás”!”chapeou” o macaco
para bem longe...
Sacudindo
os ombros, limpando com as costas das mãos o suor que escorria pelo rosto,
desabafou: - “ Isso é procê não misturar mais comida dos outros, seu sem-vergonha
!”...
Luiz Gonzaga de Oliveira