Os primeiros habitantes do arraial de Uberaba construíram suas moradias na parte central da cidade, localizada numa depressão, que corresponde ao trecho do calçadão da Rua Artur Machado. O viajante Barão de Eschwege, que passou no arraial em 1816, citou a presença de nove famílias e 47 moradores nessas imediações (ESCHEWEGE, 1994, P. 93). Três anos após, o francês Saint Hilaire passou por Uberaba e destacou: “... o arraial é composto de umas trinta casas espalhadas nas duas margens do riacho e todas, sem exceção, haviam sido recém construídas (1819), sendo que algumas estavam inacabadas quando por ali passei. Muitas delas eram espaçosas, pelos padrões da região, e feitas com esmero...” (HILAIRE,1975, P. 150).
Com o crescimento da cidade, outros locais foram ocupados e, devido ao relevo (topografia) do local foram povoadas áreas de maiores altitudes, conhecidas no século XIX como Colinas. O traçado das ruas seguia o padrão de algumas cidades do Brasil – colônia, com alinhamentos irregulares, como se pode perceber nas cidades de Paracatu, Ouro Preto e Sabará, em Minas Gerais. Outra cidade com essas características é a cidade antiga de São Mateus, Estado do Espírito Santo. De acordo com Borges Sampaio:
“...os primeiros habitantes, não prevendo talvez o grande desenvolvimento que o povoado - Uberaba - em breve tempo havia de atingir e o importante papel que mais tarde representaria no País, não seguiram, desde o princípio um plano retangular de arruamento para as edificações dos prédios públicos. Antes, desprezando esse alinhamento regular, que tanto convém e agrada nos grandes, como nos pequenos povoados, foram edificando casas, formando os quintais e chácaras, acompanhando as ondulações do terreno e serpenteando dos pequenos regatos, quiçá porque assim se lhes oferecia melhor comodidade para o uso das águas, utilizando-se mais da fertilidade do solo (...) daqui veio a rua principal, a primitiva, a maior e mais importante, aquela que por muito tempos se chamou - Direita - é das menos retas, ocasionando, ela mesmo,a irregularidade que hoje se lamenta...” (SAMPAIO, 1971, P. 47)
Em seu estudo topográfico publicado no ano de 1880, Sampaio identificou a existência de 6 colinas, onde atualmente se encontram os seguintes bairros: Boa Vista, Estados Unidos, Abadia (Colina da Misericórdia), Leblon (Colina do Barro Preto), São Benedito (Colina da Matriz) e Mercês (Colina Cuiabá). Nessa época, o bairro Boa Vista compreendia também o bairro do Fabrício, que ainda não tinha esse nome (SAMPAIO, 48).
Uberaba do século XIX, com apenas 6 colinas.
Observação do Vale à partir do Mirante da Univerdecidade
O termo colina utilizado por Sampaio referia-se aos pontos mais altos da cidade, naquela época. Do ponto de vista geomorfológico, o relevo de Uberaba se caracteriza, na realidade, como uma planície de deposição sedimentar (depressão), com material oriundo das altas cadeias que havia na região de Araxá (Serra da Canastra). Devido ao fato de que esse material sedimentar ser suscetível a erosões, o deslocamento das águas dos córregos moldou a topografia de Uberaba, fazendo surgir alguns vales, onde hoje se encontram as principais avenidas da cidade, como Avenida Leopoldino de Oliveira, Santos Dumont, Guilherme Ferreira e Fidélis Reis.
Durante o século XX, Hildebrando Pontes, substituiu o termo Colinas por Altos e identificou mais um Alto, o Fabrício (PONTES, 1978, P. 274). Nessa época, o Alto do Fabrício já havia se desmembrado do Alto Boa Vista e sua nomenclatura refere-se ao ferreiro Fabrício José de Moura, morador da Praça Santa Teresinha, que mantinha uma oficina de ferreiro e uma hospedaria, atividades convenientes para a recepção de comitivas de viajantes e de carros de bois, que chegavam a Uberaba pela região onde hoje se encontra a Avenida Pedro Lucas, ou corredor dos boiadeiros, que servia de acesso à Uberaba para quem vinha do norte do Triângulo Mineiro, do arraial de São Pedro de Uberabinha (atual Uberlândia), Palestina e Mangabeira.
Uberaba do século XX, com as 7 colinas.
Observação do Vale à partir do Mirante da Univerdecidade
Nos dois autores, a delimitação dos bairros acontece naqueles vales, onde correm córregos que, canalizados, deram lugar às avenidas. Assim, podemos identificar o córrego da Estação e do Pontilhão na atual Avenida Fidelis Reis. O Córrego Barro Preto, atual Guilherme Ferreira e o Córrego da Manteiga, atual Avenida Santos Dumont. De acordo com o mapa de Uberaba confeccionado pelo engenheiro Abel Reis em 1942, o Córrego Olhos D’água nasce nas proximidades do Conjunto Frei Eugênio e segue até o Mercado Municipal. Daí para a frente, esse Córrego deságua no Córrego das Lages, que percorre o trecho do Mercado Municipal, sentido Univerdecidade, até o Rio Uberaba e drena toda a bacia da cidade.
Como vimos, houve uma diferença na identificação das colinas entre Sampaio e Pontes. No século XIX em nenhum momento aparece a expressão “sete colinas”, o que ocorre com freqüência no século XX, conforme podemos verificar nos estudos de Hildebrando Pontes (PONTES, 274). De acordo com o professor Carlos Pedroso, é provável que essa denominação tenha entrado no domínio popular depois da vinda do primeiro bispo Dom Eduardo Duarte Silva para Uberaba. Segundo ele, Dom Eduardo morou na cidade de Roma, conhecida desde a antiguidade como cidade das sete colinas. “Naturalista e observador, não é difícil supor ser o bispo o único curioso observador dos córregos e colinas”, afirma Pedroso.
A conceituação inicial das colinas nos séculos XIX e XX se limitava aos bairros próximos do centro. Com o crescimento da cidade de Uberaba e o surgimento de novos bairros na zona periférica é difícil compreender a manutenção do mesmo conceito inicial das colinas. Afinal, quantas colinas existe na Uberaba atual?
Marta Zednik de Casanova – Superintendente de Arquivo Público
João Eurípedes de Araújo – Diretor de Difusão, Apoio á Pesquisa e Atendimento
Luiz Henrique Cellurale – Pesquisador
Donizete Fontes Calçado – Pesquisado