A FONTE DA DONZELA
Se poesia é
beleza e tragédia é dor e se beleza não combina com sofrimento, e se não lhe
for antípoda é pelo menos incompatível, como se elaborar obra em que esses dois
elementos tão díspares se unam simbioticamente, concorrendo de iguais modo e
conformidade para sua formação?
Se uma é beleza, pureza, alegria, vida
e outra é sua negação?
É possível?
É possível.
É exatamente isso que Ingmar Bergman
faz em A Fonte da Donzela (Jungfrukällan,
Suécia, 1959), um dos mais belos e ao mesmo tempo mais trágicos filmes já
realizados.
Inserido nos limites da narrativa,
excede-a em perfeição. Confinado na necessidade de estabelecer a sucessão de
atos, atitudes e acontecimentos que a compõem, infunde-lhe precisão, conexão e
intrínseca dinâmica, emanada da articulação de seus diversos elementos.
Obrigado a organizar e distender o fio narrativo, o faz com vigor, segurança e
determinação. Tangido a lidar com anjo, demônios e seres humanos, os reúne no
mesmo espaço e em idêntico tempo, confrontando-os. Compelido a destilar todo o
horror desse encontro e embate, exercita-o, no entanto, humana e poeticamente.
Assim, se se tem de um lado a
inocência, a pureza, a beleza, a poesia enfim encarnada, e, de outro, a
impulsividade e a bestialidade em seu mais alto grau, logra-se, como resultado
desse heterogêneo amálgama, filme em que a dignidade humana é contemplada tanto
quanto sua face oposta nos exatos termos em que se manifestam, constituindo
monumento desse compósito extravagante.
Toda essa confluência, que se
transforma em conjunto trágico, violento e mortal, expõe-se em ambientes
construídos em consonância com a vinculação do tempo e do espaço em minudências
físicas e gestos pessoais compatíveis e exatos. Se neles e nisso ressumbra a
realidade, nos exteriores explode e vigora a poesia da imagem na paisagem vista
(e sentida) em sua harmônica beleza, onde se cruzam a mocidade que a tonifica e
os cérberos abjetos que a poluem e conspurcam.
Nessa dimensão neutra, mas, generosa e propiciatória, a maldade impõe-se
à bondade, destruindo-a dupla e sucessivamente, antes, ao conspurcá-la, depois,
ao eliminá-la, em sequência de beleza imagética, que mais ainda exacerba a
inaudita brutalidade com que se manifesta e se materializa.
(dos livros eletrônicos O Cinema de Bergman e Fellini -
Se poesia é
beleza e tragédia é dor e se beleza não combina com sofrimento, e se não lhe
for antípoda é pelo menos incompatível, como se elaborar obra em que esses dois
elementos tão díspares se unam simbioticamente, concorrendo de iguais modo e
conformidade para sua formação?
Se uma é beleza, pureza, alegria, vida
e outra é sua negação?
É possível?
É possível.
É exatamente isso que Ingmar Bergman
faz em A Fonte da Donzela (Jungfrukällan,
Suécia, 1959), um dos mais belos e ao mesmo tempo mais trágicos filmes já
realizados.
Inserido nos limites da narrativa,
excede-a em perfeição. Confinado na necessidade de estabelecer a sucessão de
atos, atitudes e acontecimentos que a compõem, infunde-lhe precisão, conexão e
intrínseca dinâmica, emanada da articulação de seus diversos elementos.
Obrigado a organizar e distender o fio narrativo, o faz com vigor, segurança e
determinação. Tangido a lidar com anjo, demônios e seres humanos, os reúne no
mesmo espaço e em idêntico tempo, confrontando-os. Compelido a destilar todo o
horror desse encontro e embate, exercita-o, no entanto, humana e poeticamente.
Assim, se se tem de um lado a
inocência, a pureza, a beleza, a poesia enfim encarnada, e, de outro, a
impulsividade e a bestialidade em seu mais alto grau, logra-se, como resultado
desse heterogêneo amálgama, filme em que a dignidade humana é contemplada tanto
quanto sua face oposta nos exatos termos em que se manifestam, constituindo
monumento desse compósito extravagante.
Toda essa confluência, que se
transforma em conjunto trágico, violento e mortal, expõe-se em ambientes
construídos em consonância com a vinculação do tempo e do espaço em minudências
físicas e gestos pessoais compatíveis e exatos. Se neles e nisso ressumbra a
realidade, nos exteriores explode e vigora a poesia da imagem na paisagem vista
(e sentida) em sua harmônica beleza, onde se cruzam a mocidade que a tonifica e
os cérberos abjetos que a poluem e conspurcam.
Nessa dimensão neutra, mas, generosa e propiciatória, a maldade impõe-se
à bondade, destruindo-a dupla e sucessivamente, antes, ao conspurcá-la, depois,
ao eliminá-la, em sequência de beleza imagética, que mais ainda exacerba a
inaudita brutalidade com que se manifesta e se materializa.
(do livro eletrônico O Cinema de Bergman e Fellini -
______________
Guido Bilharinho é
advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão
de 1980 a 2000 e autor de
livros de literatura, cinema, estudos brasileiros, história do Brasil e
regional. -
Obras-Primas do Cinema Europeu -
https://www.facebook.com/opcineuropeu/)
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Guido Bilharinho é
advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão
de 1980 a 2000 e autor de
livros de literatura, cinema, estudos brasileiros, história do Brasil e
regional.
Cidade
de Uberaba
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