Família Soukef |
Não
sei por que, mas sou herdeira das “importâncias” de algumas pessoas.
Os
objetos chegam sem que eu os solicite, sem que eu peça.
Foi
assim desde sempre…
Foi
assim com uma antiga máquina de escrever vinda de uma pessoa que eu pouco
conhecia; foi assim com uma máquina de costura, destas manuais, que veio de
outras histórias; foi assim com o caderno de receitas da Doce vovó Lígia…
As
pessoas me confiam seus tesouros e eu os faço meus.
Ah!
Fotos antigas! Várias!
Esta
aqui é uma das primeiras e únicas fotos da Família Soukef, que me foi confiada
pelo avô Rané Soukef.
Nela,
estão meus bisavós, Espir Cecílio Soukef e Sarah Dib Soukef, e seus filhos,
Jorge, Rané, José e Jamil.
Foi
tirada assim que chegaram ao Brasil, assim que se instalaram em Pirajuba.
Reza
a lenda que o meu tio- avô Jamil (este rapazinho com um bigode incipiente)
fugiu para o Brasil. Seu Pai, Espir, claro, veio atrás, e deixou no Líbano
minha bisavó Sarah e os pequenos.
Aqui
no Brasil, uma epopéia para encontrar Jamil. Tempos depois, já com Jamil
finalmente a seu lado, ele percebeu que não podia voltar. Estava perdidamente
apaixonado pelo País e seu povo. Alegre, brincalhão e comunicativo o Vô Espir
fez amigos, comprou uma propriedade, abrasileirou-se.
Três
anos depois, voltou ao Líbano só para buscar sua Sarah e os meninos.
Com
ele vieram meninos assustados e uma Sarah obediente.
Veio
sem querer vir.
Veio
sem conhecer.
Veio
sem gostar.
Veio
sem reconhecer naquele homem seu companheiro de antes…
Obstinada
essa minha bisavó.
Viveu
no Brasil 40 anos.
Enviuvou,
viu os filhos crescerem e sumirem o mundo, viu os netos chegarem.
Mas
nunca, nunca mesmo disse uma só palavra em português. Nunca se rendeu a moda e
aos costumes daqui.
Permaneceu
em um Líbano solitário e silencioso.
Só
dela…
Dos
tesouros da Vó Sarah eu quase nada sei. Só tive notícias de existência de um
pilão de pedra que ela usava para triturar o trigo.
Não
sei onde ele foi parar.
Dela
só herdei um pouquinho de obstinação.
Rita
Soukef