sexta-feira, 23 de junho de 2017

A ÁGUA DEU...

    Uberaba sempre viveu horas de pesadelo com as pesadas chuvas que caem sobre a terrinha e que, rapidamente, tornam-se quase em catastróficas enchentes...Aliás, enchentes é como doença; quando menos se espera ,ela chega. Estava todo mundo queixando-se do calor infernal que assolava a cidade, pedindo uma chuvinha leve para refrescar o ambiente,verdejar nossos campos, lavar a poeira que paira sobre ruas e calçadas empoeiradas. De repente, a chuva cai ! Sem dó, nem piedade, levando tudo de roldão:carros, motos,lixo,bicicletas,biroscas,sanitário ambulante e outros pertences...A cidade virou um caos. A população estupefata,medrosa sem acreditar no que via no centro e alguns bairros. Aquela torrente levando sujeira,muita sujeira,além de obras(?)públicas , só preservando almas imundas,bem sujas, dos nossos políticos...”Selfies” registrados aos montes,de baixo e de cima dos prédios da avenida...Em menos de hora de tormento,o centro da cidade,ficou barro só.Carro sobre carro,água sobre casas,água no leito do rio, água fora do leito de córregos e canais,água nos bancos,água nas lojas... a poeira e o calor maldito,cederam lugar às águas barrentas da volumosa enxurrada. Chuva que se pedia branda, manhosa,dengosa, que pudéssemos controlar a mão divina, não veio...Chegou sim, a chuva de alerta,de raiva, a chuva forte que a mão do homem não pode conter..Jogaram a culpa no coitado do S.José..fazer o quê ? Diz o ditado dos antigos que “ a água leva e água lava”...Lava a alma e o corpo, lava nossas verdades, como também lava nossas mentiras.


Dondico,homem simples,iletrado,formado na escola da vida, meu ídolo eterno,meu pai,contou-me,ainda garoto e que guardei para sempre, uma historinha de água, “ a mãe natureza”.Seguinte:
-“Pequeno sitiante,lá pelas bandas do Cassú,a duras penas, mantinha a família(pai e mãe),com o leite de 10 vaquinhas.Depois ,os pais faleceram.Ele,recatado,vida honesta,ali. Um belo dia,recebeu terrível “cantada”- porque não colocar água no leite?ninguém ficaria sabendo e a sua renda, aumentaria.O corguinho do “Óleo”,passava nos fundos do sitio.Tentado pela indecente proposta,adotou a desonesta prática.Um litrinho hoje,2,amanhã,ninguém desconfiava e viu a renda aumentar.Gostou.A “coisa”,prosperando.Comprou mais vacas, melhores do que as suas.Alugou mais pastos.”Zé Rita”,era só alegria.Comprou cavalo novo,um bonito “mangalarga marchador”.Dinheiro no bolso,gado no pasto,montaria de primeira,iniciou namoro com a filha do fazendeiro,seu vizinho de divisa.Homem rico,de muitas terras,gado bom e filha bonita.Namoro vai, namoro vem, marcaram o casamento.”Zé Rita”,comprou sela pronta,apetrechos dourados na cabeça do arreio,camisa “xadrez da moda”,calça”jeans”,bota cano longo,bico fino,prateado.Certa noite,lua cheia,clareava o caminho.Era atravessar o “Õleo”e, do outro lado, a namorada. Felicidade maior, impossível! Foi nada, não. O tempo mudou.A água caiu de montão.O corguinho,transbordou. O “toró”custou a passar. Na volta,conhecendo o caminho,local da ponte de madeira, cavalo ensinado,acostumado a desafios,tentou passar.O “mangalarga”não resistiu,rolou córrego abaixo; com muito esforço,”Zé Rita”,alcançou o outro lado do barranco.Sem a calça de grife,só pé direito da bota, camisa rasgada...Com lágrimas nos olhos,via os últimos movimentos do cavalo,rodando rio abaixo,com a arreata cara, estribo prateado e as rédeas de crina de burro,mais caras ainda..
Com feição de dar pena, “Ze Rita”,vendo tudo indo embora água abaixo, só se lembrou de uma frase que ouvira há muito anos, “ a água dá; a água leva”..
EM TEMPO: - Qualquer semelhança com as enchentes de Uberaba, é mera coincidência...

Luiz Gonzaga de Oliveira