O ANJO NASCEU
Trajetória Bandida
Guido Bilharinho
Em plena fase do cinema marginal,
Júlio Bressane dirige O Anjo Nasceu (1969/1973),
para escarmento dos aficcionados e condicionados por estórias convencionalmente
estruturadas e conduzidas, objetivando, elementar e infantilmente, divertimento
e distração.
O Anjo Nasceu fixa momentos da carreira
delituosa de dois marginais, ladrões e assassinos patologicamente constituídos,
antecipando (ou sendo um dos primeiros) a focalizar esse tipo de psicopata
amoral, insensível, desapiedado e monstruoso, para quem assassinar friamente
seu semelhante é mero divertimento, exercício de poder e determinação homicida,
que se sobrepõe e covardemente se aproveita de vítimas indefesas.
Bressane
procura (e consegue) criar realidade fílmica tão ou mais eficaz que a realidade
da vida, visto que, ao fazê-lo, imprime-lhe o sentido e o significado que
geralmente passam despercebidos ao contato direto com o mundo real.
As
tomadas e imobilização das cenas são, por isso, alongadas, quedando-se a câmera
frente ao selecionado corte de realidade significante, cuja contemplação por si
só constitui sua própria e analítica narrativa.
Não
é, pois, filme agradável (no sentido negativo do termo) de se ver e de se
assistir, já que expõe, revela e denuncia as deformações e monstruosidades da
espécie sem disfarces e despistamentos, provocando asco e repulsa a frieza e a
displicência assassina dos protagonistas, interpretados por Hugo Carvana e
Milton Gonçalves.
Inúmeras
cenas e sequências se destacam pela sofisticação imagética e pelo teor e
significado que contêm.
Nesse
caso, além de outras, a sequência final do carro disparado na estrada com
Carvana gritando de dor em decorrência de ferimento na perna é de excelente
concepção e efetivação, atingindo o clímax com a propositada persistência desse
grito/uivo (in)humano.
Desaparecido
o carro no horizonte da rodovia, permanece apenas esta, vista em profundidade
sob esplêndida luminosidade e raros carros e sob os acordes da canção Peguei Um Ita no Norte, esta cantada e
outras músicas apenas orquestradas, provocando impactante efeito estético,
encerrando-se aí o filme, mas não a trajetória bandida dos protagonistas.
(do livro Seis Cineastas Brasileiros. Uberaba,
Instituto
Triangulino de Cultura, 2012)
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O Anjo Nasceu no https://www.youtube.com/watch?v=Ih0g5IirZJs
(Obras-Primas do Cinema
Brasileiro:toda segunda-feira novo artigo-
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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão de 1980 a 2000 e autor de livros de Literatura (poesia, ficção e crítica literária), Cinema (história e crítica), História (do Brasil e regional).